“Se os ângulos de visão variam de uma geração para outra, os problemas a se resolverem conservam eternamente os mesmos rótulos” (Sérgio Milliet). 

Semana de 22: leituras e releituras

  A Etec Cepam elegeu a temática Semana de 22: leituras e releituras como uma de suas atividades interdisciplinares no 1º bimestre. A professora Gisele, de Língua Portuguesa, Literatura e Comunicação Profissional, trabalhou com os estudantes a temática da releitura das obras de arte produzidas pelas mulheres representantes do Modernismo brasileiro. A amostra está exposta no corredor interno da escola (próximo à biblioteca). Dentre as propostas, estão contempladas releituras de importantes obras de Tarsila do Amaral: A Negra (1923), Abaporu (1928) e Antropofagia (1929); a fase surrealista está representada na tela Sol Poente. No quadro Operários (1933), Tarsila demonstra a sua preocupação social com o processo de industrialização de São Paulo. As releituras das obras de Tarsila do Amaral demonstram toda a criatividade e o olhar crítico de nossos estudantes, desde uma interpretação sob a ótica de um aplicativo de inteligência artificial (Dream by Womb), até a incorporação de visões de mundo que primam pela diversidade, inclusão e respeito aos direitos humanos.A comunidade Etec Cepam convida vocês a fazer a releitura das obras modernistas conosco!   

Ressonâncias de 1922


Mariah Gonçalves de Paula - estudante do 2º M-tec Serviços Públicos, especial para o blog. 


A Semana de Arte Moderna marcou o Modernismo no Brasil, reunindo artistas de diversas áreas (desde as artes plásticas até a poesia) no Theatro Municipal de São Paulo ao longo dos dias 13 e 18 de fevereiro de 1922. Até o início do século XX, a escola artística tida como oficial no Brasil era o Parnasianismo, que era caracterizado por sua formalidade (forte preocupação com a forma do poema no que se refere à metrificação) e pelo academicismo. Portanto, os artistas da Semana de 22 propuseram novas linguagens, novos materiais, novas propostas e novas estéticas a fim de renovar a arte nacional. Buscaram expressar a partir da arte (uma nova arte) sua inquietude frente às mudanças do cenário econômico, social e político de um país que se chocava com as marcas deixadas pelo projeto de industrialização no início do século XX. Desejavam romper o academicismo, a tradicionalidade, buscando uma identidade genuinamente nacional, assim, trazendo transformação e liberdade para a arte. 

Mas será que isso realmente aconteceu? Em partes, sim, até porque foi um marco de grande importância para a Arte Brasileira e com toda certeza chocou as classes altas paulistanas conservadoras (que possuíam um restrito conceito do que era arte). Porém, a pergunta a se fazer é: quem fez e para quem foi feita essa nova arte? Os e as artistas da semana de 22 realmente captaram e agregaram em seu movimento a realidade brasileira? 

A nova experimentação de arte, embora tenha incomodado os conservadores da época, foi financiada pela própria elite cafeeira. Paulo Prado, por exemplo, um burguês que vinha de uma família escravocrata foi um dos financiadores da Semana. 

A leitura do evento (embora quisesse fazer e tenha feito certas rupturas) ainda era da burguesia. As artes expostas foram produzidas por intelectuais brancos de classe média alta (ou até mesmo burgueses descendentes de oligarcas do café) que sempre tiveram acesso à educação e ao ensino superior. 

Não foi um espaço feito nem pensado para o povo brasileiro, e quando digo o povo, quero dizer a classe trabalhadora. A classe trabalhadora pobre, preta e periférica, que fica sempre em todas as esferas e épocas recolhidas às margens da sociedade. E isso não foi diferente na Semana de Arte Moderna. O que foi debatido, apreciado e proposto no evento foi feito pela e para a elite. 

Todas essas novas formas de pensar que de um certo modo eram sim revolucionárias, ficaram represadas para quem tinha e ainda tem uma ascensão social e econômica. Então, não houve uma real ruptura do academicismo visto que as obras eram feitas e prestigiadas por acadêmicos. Não houve um real incômodo da burguesia industrial (que crescia na época), até porque foram eles mesmos que financiaram a Semana e somente uma classe específica poderia e pôde produzir e experimentar essa “nova arte''. Ou seja, a liberdade continuou e continua limitada. 

Além da questão de classe e raça, também existiu a questão de gênero. Na exposição de artes aberta no saguão do Teatro, havia dez homens e apenas Anitta Malfati e Zina Aita como mulheres. Para cerca de trinta participantes, havia apenas quatro mulheres, o que fazia mais ou menos 10% de participação feminina (sempre importante ressaltar: quando existia uma participação, era exclusivamente de mulheres brancas).

Então, sim, a Semana de 22 apesar de ter quebrado alguns paradigmas e ter sido extremamente relevante, foi também completamente elitista e excludente. É interessante pensarmos nisso, por quem e para quem são feitos os diversos espaços culturais de São Paulo? 

Até hoje temos o belo Theatro Municipal que vem tentando se tornar mais acessível, porque claramente ele não foi feito para o povo usufruir. Mas mesmo que existam políticas de “inserção”, como ingressos grátis e diversidade nas apresentações, ainda existe um muro denso que não permite que a classe trabalhadora tenha acesso a esses espaços. Quando andamos pelo centro de São Paulo conseguimos enxergar claramente esse muro, quando olhamos para fora do Theatro vemos o povo. A cada passo dado vemos uma barraca de acampamento que é o teto de uma família, e o Theatro está bem ali, do lado deles. Será que alguma vez na vida eles já pisaram lá dentro? E você, seus pais? Quantas vezes já foram em alguma apresentação ali? 

O muro invisível, que muitas vezes de invisível não tem nada, é pensado e construído pela burguesia com apenas um propósito: manter as relações de poder. E a nossa função enquanto estudante, e sobretudo, enquanto povo, é derrubar de uma vez por todas: esse muro. 


Fontes: 

https://www.esquerdadiario.com.br/Arte-Politica-e-Marxismo-100-anos-da-Semana-de-Arte-Moderna

https://www.brasildefato.com.br/2022/02/13/afrontosa-ou-aristocratica-bdf-explica-a-semana-de-arte-moderna-de-1922

https://www.brasildefato.com.br/2022/02/17/excludente-elitista-e-patriarcal-pesquisadora-amplia-olhar-critico-sobre-semana-de-22?fbclid=IwAR1pYPB7IUEolgHD-ZDhmi4JscRwChqNb6uIsR5akf3cyUvuLqIquzdbMh8#:~:text=Araci%20Amaral%20e%20outras%20e,%22a%20ind%C3%BAstria%20da%20USP%22.

https://www.educamaisbrasil.com.br/enem/artes/semana-de-arte-moderna

Afinal, a Semana de Arte Moderna foi tão importante assim?

Excludente, elitista e patriarcal? A pesquisadora Márcia Camargos amplia olhar crítico sobre Semana de 22 e aborda o legado, a importância e as contradições do evento que completa 100 anos em 2022. Leia o post a seguir!

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